11/30/2005

sair sem o caderno, não sabia.

Erika David


quando ainda a letra era redonda e clara já ela o carregava como parte de si desde manhã.

é como os comprimidos que lhes dão na fábrica, não curam, aliviam. escrever é um desses comprimidos para mim. não cura o que na alma dói, distrai a dor.

e ia pelos campos mais presa a aves e árvores que a gente.

mas saltemos a infância por agora. eu sei que não é de costume.

pensem num flash back de cinema, confesso que pessoalmente detesto filmes a começar pelo fim, mas garanto, não será este o caso. os papéis de Maria não foram ordenados, sairão ao acaso. quem uma vez os ler que trate, se quiser. de lhes dar a ordem que entender.

sinto-me só. de uma solidão tão grande e escura como imagino a morte. mas estou viva. mexo-me, olho e vejo. e bem mais do que queria vejo eu.



os mal amados são sempre maus e há tantos. quem não os soube amar, tantas vidas estragou.

se quisesse encontrar responsáveis teria de começar tão longe que o melhor é deixar tudo como está.

at .moonmoth.co.uk

aprendera já a olhar mais que a paisagem. olhava agora as gentes e os seus comportamentos, com olhar de lince, mas não de predador.

11/29/2005

chamo-lhe Maria

Emil Schildt


é apenas um nome, um nome simples. mas carregado de raivas e porquês.

assim a chamarei de hora em diante. não terá rosto nem origem sequer. que importa isso? Marias, como ela, há aos milhões por certo.

o que pode importar, a mim que a narro, é a sua experiência de mulher, num mundo de aço e pedra para quem, como ela, nasceu frágil, de papel.

Maria .

ouviu vezes demais o seu nome gritado, sem carinho, na infância.

nascera para largos espaços, longes para onde olhar e confinaram-na a burgos mais ou menos pequenos.

Carolyn E. Wright

tinha asas de voo largo e longo curso. mas todas as outras gentes que a cercavam, tinham os pés e os olhos presos ao chão.

deu em encontrar forma diferente de voar, escreveu.

e é dos seus escritos, um dia perdidos e hora achados em velha arca, que conto o que à frente seguirá. sem lhe poder pedir, que não existe.

Maria viverá , mas aqui só.

11/28/2005

o início

o início de mim foi de papel.
cá fora havia vida de carne e osso aos encontrões , cedo comecei a rasgar-me por isso.
para disfarçar, endureci o material e fiz-me de papel plissado. de amálgama em amálgama cheguei mesmo a ser de papelão.

fortaleci. auto reciclei-me.

hoje sou tronco velho.

de tanta adaptação cheguei à origem, voltei a árvore. dei até frutos de papel.

antes que da actual textura nada sobre, tentarei aqui falar desta estranha mas intensa, experiência de vida de papel.

By Ognid - CATEDRAL


em breve serei árvore morta, é normal. mas nada quero deixar de vos dizer.

é que nada se perde amigos, a menos que se queira perder.

Isto Não É Um Diário.

----------